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domingo, 22 de março de 2009

Impacto que matou dinossauros não iniciou incêndio mundial


Philip Ball

Estados Unidos

O impacto de um grande asteróide ou cometa contra a Terra, acontecido no final da era cretácea, 65 milhões de anos atrás, é em geral visto como responsável pelo fim súbito de entre 60% e 80% de todas as espécies então existentes no nosso planeta. Mas novos estudos contestam a idéia comum de que as extinções tenham sido ao menos parcialmente causadas por imensos incêndios de alcance mundial deflagrados pelo violento impacto.

Claire Belcher e seus colegas na Royal Holloway University of London, no condado de Surrey, Reino Unido, afirmam em um estudo publicado na mais recente edição da Proceedings of the National Academy of Sciences USA que os depósitos de fuligem generalizados encontrados em rochas sedimentares formadas mais ou menos no período do suposto impacto não eram, ao contrário do que se imaginava anteriormente, indícios de incêndios descontrolados causados pelo impacto do meteorito.

Eles analisaram as misturas de moléculas com base em carbono chamadas de hidrocarbonos policíclicos aromáticos (PAH), localizadas no material fuliginoso contido nessas rochas, e constataram que as composições das misturas não se equiparam corretamente às produzidas pela queima típica de vegetação. Em lugar disso, parecem se assemelhar mais às misturas formadas quando hidrocarbonetos como o gás natural e o petróleo são queimados.

Questão incandescente

Os pesquisadores acreditam que a fuligem venha da combustão de hidrocarbonetos dentro das rochas no local de impacto em si - supostamente a região em torno de Chicxulub, na costa norte da Península do Yucatán, México, onde uma cratera hoje parcialmente submersa, com cerca de 180km de diâmetro, teve sua formação datada da época da extinção maciça que separa as eras cretácea e terciária.

Uma camada mundial de fuligem em rochas dessa idade foi descoberta no final dos anos 80 e interpretada como demonstração de que o calor do impacto deflagrou incêndios em matas de todo o mundo. De acordo com essa hipótese, vastas porções de plantas terrestres entraram em ignição, e possivelmente causaram a extinção de muitas espécies de animais, entre as quais os dinossauros.

Mas já há diversos anos, Belcher e seus colegas vêm lançando dúvida sobre a idéia de que a Terra passou anos envolta em chamas depois do impacto. Em 2003, eles reportaram que estratos de rochas datados do período de transição entre cretáceo e terciário, localizados na América do Norte, demonstravam poucos traços de presença de carvão, um subproduto esperado da queima de vegetação.

Em lugar disso, especularam eles, a fuligem nessas rochas talvez viesse da combustão de hidrocarbonetos. Agora a equipe alega ter encontrado uma prova que confirma essa suposição: traços químicos da fonte da fuligem, na forma de 21 PAHs diferentes, separados e identificados utilizando técnicas de cromatografia a gás.

Belcher diz que os novos resultados também resolvem as críticas quanto a seus trabalhos anteriores sobre a aparente falta de carvão na fuligem. Alguns outros pesquisadores haviam sugerido que os grandes incêndios nas matas causados pelo impacto poderiam ter sido intensos a ponto de não deixar qualquer carvão. Mas Belcher afirma que os PAHs que vêm encontrando têm estruturas moleculares características de uma formação a temperatura relativamente baixa.

Das cinzas às cinzas

Mesmo assim, a pesquisadora e seus colegas ainda terão de se esforçar para convencer alguns dos observadores mais céticos. Bernt Simoneit, geoquímico orgânico da Universidade Estadual do Oregon, em Corvallis, questiona se as proporções de diferentes PAHs encontradas nos subprodutos da combustão permitem obter assinatura suficientemente precisa quanto à fonte de combustível envolvida.

Ele também diz que as fontes de hidrocarboneto de petróleo existentes em baixa profundidade "são muito escassas agora, e sempre o foram", e que a biomassa de vegetação supera de longe o volume de petróleo presente perto da superfície. Belcher e seus colegas apontam, no entanto, que o local da cratera em Chicxulub fica bem perto do maior reservatório de petróleo do México, o campo de Cantarell.

Não importa qual seja a origem efetiva da fuligem, os estudos realizados até agora parecem deixar bastante claro que imensos volumes de pó foram arremessados à atmosfera pelo impacto, o que bloqueou a luz solar que penetrava até o solo e talvez tenha deflagrado um período de resfriamento global, causando um chamado "inverno de impacto".

"A fuligem mesma sem dúvida teve impacto significativo sobre a vida naquele momento, mas é improvável que represente um traço da prevalência de incêndios violentos em todo o planeta", diz Belcher. Ela afirma que houve sinais claros de que a vida vegetal foi seriamente prejudicada, mas que isso também poderia ter acontecido devido ao calor gerado pela bola de chamas do impacto, e pela escuridão planetária, o frio e o envenenamento causado por produtos tóxicos gerados pela queima de hidrocarbonetos que pode ter surgido a seguir. "Acredito que estamos começando a debelar as chamas, quanto a essa idéia de uma fogueira de alcance mundial".

Tradução: Paulo Migliacci

Fonte: Nature News/Terra

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