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segunda-feira, 14 de julho de 2008

"Eco" do Big Bang enfraquece raio cósmico

Um dos detectores do Observatório Pierre Auger, na Argentina; pesquisa indica que radiação do Big Bang interfere em raio cósmico


(Folha) Pesquisadores de uma colaboração científica entre 17 países, incluindo o Brasil, mostraram que os raios cósmicos, as partículas mais energéticas do Universo, precisam encarar um redutor de energia implacável em seu caminho: a radiação remanescente do Big Bang, que permeia o espaço. Analisando dados do detector Pierre Auger, construído em Malargüe, nos pampas argentinos, os físicos atestaram o fenômeno.

Descoberta em 1965, a radiação cósmica de fundo --microondas fraquíssimas que permeiam todo o espaço-- é uma espécie de "eco" da explosão que deu origem ao Universo, há 13,7 bilhões de anos, o Big Bang. Já raios cósmicos são um fenômeno distinto, constituídos de núcleos de átomos ou partículas subatômicas que viajam em velocidade próxima à da luz.

Em 1966, físicos teorizaram que a radiação de fundo influenciaria os raios cósmicos, fazendo-os perder força a medida que iam "trombando" nela. Ninguém esperava, por isso, observar na Terra raios com energia acima de determinado valor, chamado "limite GZK".

"Ao longo dos anos, porém, os experimentos foram detectando raios cósmicos com energia superior, o que era um paradoxo", explica Ronald Shellard, pesquisador do CBPF (Centro Brasileiro de Pesquisas Físicas) e do Pierre Auger.

Teóricos cogitaram, então, que esses raios transgressores de limites seriam produzidos quando partículas superpesadas desconhecidas, criadas talvez durante o Big Bang, explodissem. A descoberta dessas partículas revelaria a existência de uma nova física --talvez a tão sonhada "teoria final" que unificaria todas as leis físicas.

Nos últimos dez anos, antes do Pierre Auger, os únicos experimentos que puderam investigar a questão dos raios cósmicos além do limite GZK foram o japonês Agasa e o americano HiRes. O Agasa observou alguns raios acima da fronteira. Já o HisRes não viu nenhum, indicando que o limite GZK existe e é respeitado.

A mesa e a régua

A questão, então, continuou pendente. "Os instrumentos anteriores [ao Pierre Auger] não tinham a sensibilidade e a precisão para verificar de fato o fenômeno", diz Shellard. Uma das dificuldades de trabalhar com raios cósmicos é que, a rigor, medir algo significa comparar uma coisa com outra. Quem quiser saber a altura de uma mesa compara-a com a altura de uma régua. Energias no limite GZK, porém, são tão altas que não há padrão direto de comparação --faz-se estimativas que podem estar erradas.

Para contornar isso, o Pierre Auger usa duas espécies de detectores de raios cósmicos. A comparação de técnicas diferentes de observação melhora as estimativas. Além disso, o detector pode captar dezenas de raios cósmicos a mais que seus antecessores.

A colaboração analisou a energia de 20 mil raios cósmicos, registrados entre 2004 e 2007, e os resultados foram submetidos à revista "Physical Review Letters". Os físicos relatam que, acima de certa energia, muito próxima do limite GZK, o número de raios cósmicos cai bruscamente.
Em outra descoberta recente, o Pierre Auger viu que os raios cósmicos são em sua maioria prótons, vindos de regiões do céu marcadas por galáxias com centros cuspidores de gás e radiação. Com base também nesse trabalho, físicos crêem que a queda observada no número de raios ultraenergéticos ocorra mesmo em razão do limite GZK.

Para Shellard, os dois últimos resultados do Pierre Auger dão "um banho de água fria" em teorias alternativas, nas quais fenômenos bizarros impulsionam os raios cósmicos. Ele reconhece, porém, que as conclusões do experimento na Argentina não são definitivas. "Sempre há lugar para algo estranho ou desconhecido, mas esse lugar parece cada vez menor."

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